quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Seis de outros
            Por hoje, só mais uma consideração de recortes e descobertas das cores e palavras nas pessoas que senti por estarem atrás duma lente dizendo sobre suas rugas, lágrimas e sensações. Uma cultura que mostra todos como diferentes no olhar e na maneira de viver a terra. Eu todo assim, cheio de sucesso, grana no desejo e tudo que a indústria tem de  saboroso está no meu sorvete. Tomo com deleite, pois sou filho da escola e do ódio.( Quem me ensinou a odiar?). Essa vem de seis bilhões de pessoas. Mas enfim, é a dor de não suportar o fato que terei, e por sensibilidade,  que encarar o rosto que está no espelho. E dizer alto que sou uma mistura perfeita e consciente de um capitalismo sem volta. O verde vai vencer, mas na memória da maioria estará somente o cinza urbano, pincelado cuidadosamente nas telas internas de cada um. Tenho vergonha das belezas, pois mostram minhas fraquezas. E por pior que pareça estamos assim jogados no sofá escolhendo botões de nossa felicidade. Dar risada é artigo de luxo, estou a procura de alguém que me mostre uma casa        
com teto de azul e calmaria. Eu grito!!!
            Desespero, vou te contar uma historinha... era tarde o menino que  aqui dorme sonhou. Ele queria uma bicicleta,  e no sonho ele corria em ruas de procissão. Uma festa, todo mundo olhando para ele e orando para o menino Jesus. Cores e mais cores. Senhorinhas e velhinhos com seus terços e tempos marcados por mãos e pés grossos de trabalho e vida. De repente, um carro atravessa a rua, todos olharam para o menino e ele já não estava ali... Havia sido agarrado pelo tio, para dormir.
Seu último sono materno e a bicicleta em todos os desenhos pela parede. Iria dormir anjo e acordar odioso sem saber de onde veio esse sentimento. Um sono... um espirro... um bocejo... um sorriso de criança que dorme brincando.
            Manhã seguinte sua mamãe o acordou. Ele estava com saudade, fazia dias que não a via. Ela magra, semblante escuro e triste, o corpo quase morto, mas a felicidade era transcendente, ela o abraçava pela última vez, foi o carinho mais profundo que vi. O choro escorria em cachoeiras. O mundo estava colorido de vermelhos e árvores de natal. Criança é feliz porque não vê doença.  Ela estava colocando ponto final, o sentimento mais duro de entender. Ele feliz viu sua primeira e grande bicicleta, azul e branca, toda preparada para correr e com rodinhas que são os braços da mãe para o cuidado. Ele correu para a bicicleta, tiraram fotos, ela foi para cama morrer.
            Para se entender a bicicleta é necessário:
1.1)                      aventura de rodinhas e pernas de borboletas;
1.2)                      coragem para atravessar o quarteirão;
1.3)                      amiguinhos para corrida;
1.4)                      pistas imaginárias;
1.5)                      rampas com asas;
1.6)                      terra sem cascalho;
1.7)                      equilíbrio de rimas e suspensão;
1.8)                      vento para o abraço;
1.9)                      amizade com bicicleteiro;
1.10)                  um dedo de choro para os joelhos e cotovelos.
            No outro dia, ele sentia a bicicleta no corpo. Acordou cedo já querendo brincar. Sua casa cheia de gente, todo mundo em estado de reticências, ele não entendia, foi devagar perguntar onde estava sua bicicleta e encontrou uma responta estranha. - Filho, sua mamãe morreu. Ele pegou a bicicleta e foi brincar.
            Ficou para depois o ódio, o perdão e amor.

leandro rosa felix, ,  professor, baixista da banda livre docente de franca e amigo de longa data, é o cara que iniciou o fanzine âncora comigo e que também pode reivindicar a paternidade desse blog. bem vindo, companheiro. amante das letras minúsculas.




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