segunda-feira, 24 de outubro de 2011







Os pés...

                Explico o porquê, na verdade nem contei para explicar, estou na sensação, e um exercício violento para educar meus impulsos. Eu quase trinta, profissão prazerosa e pouco rentável, a vida e sonhos muitos mais acomodados que inertes, e a rotina no meu copo d'água. Já tinha desistido de Lord  Byron e as profundezas. Fui um misto de tentativas e medos. Experimentei o amor e a destruição. A futilidade e o enfrentamento desciam por escombros dentro de mim. Havia tomado uma decisão, ficaria para titio.

                Fevereiro primeira aula do ano, turma nova e boas expectativas. Galera atenta e disposta. A rotina e as descobertas de narrativas ansiosas pela muralhas da caminhada. Eles querem ser vistos da lua.  Reconheço alguém do meu passado próximo, passado em textos e teatros. Tinha trabalhado numa peça Roseana e ela estava lá no processo, não conversamos muito, mas foi o suficiente para gostarmos um da fotografia do outro.

                Com o tempo nos aproximamos,  eu profissional e ela curiosa. e percebemos que muita coisa nos afinidava. Música, teatro, dança e principalmente sensibilidade. Como adorávamos nos afundar nesse balde de sensações humanas. Nossas conversas foram ficando mais como álbum de figurinha, a todo momento um chegava com uma que faltava. Ela cheirosa, às vezes de cabelo molhado, e um detalhe que é um deleite, seus pés. Sim, sou um homem comum, com fetiches em pés. Eles eram pequenos, tamanho 34 ou 35, pele clara e fina, unhas grandes nos dedos, sem marcas           e perfeitamente encaixados num chinelo simples, mas que brilhava naquele instante.

                Fiquei apaixonada por eles, e aqui faço uma ressalva, ela também era bonita, pois raiz boa dificilmente dá frutos ruins. Sonhei meses com aqueles pés, mas não podia manisfestar nada, pois era minha aluna com seus dezessete anos. Sempre respeitei esta condição.

                Ela demostrava interesses pelas aulas, mas principalmente pelas conversas. E aqui confesso que evitei. Ela chegava mais cedo, propunha bons temas e espertamente sabia o eu que gostosa. Tinha o capricho de colocar Jaco Pastorius no mp3 só para me deixar louco, mas os pés me calavam, os sonetos amorosos de Vinícius começaram a fazer sentido. Tudo era brumal naqueles minutos.

                Um dia ela saiu chorando de uma aula, era pela sensibilidade, cada gota sua era uma enxurrada para mim. Percebi que ela começou andar pelos meus caminhos e me observar.

Quem imagina. Nos falamos de maneira objetiva, ela com aqueles pés que dariam um novo destino a minha vida e eu sem nada a oferecer. Nos encontramos numa festa, dançamos, rimos, não conseguíamos ficar longe um do outro. No meio do turbilhão, ela disse que iria embora comigo.      Custou-me um emprego, que foi o preço mais barato que paguei por algo sem valor mensurável e maravilhoso. Sim, fiquei louco, mas deixo minha inquietação e me exponho dizendo que sou vítima daqueles pés.

Um instante...

                Levei-a embora, ela estava sem sandálias, quando parei o carro em frente sua casa  e fui me despedir vi seus pés e reticente a beijei. Ela me entregou o sonho e  foi pela calçada. Seu cheiro me entorpeceu, seus pés marcavam minha estória para nunca mais ser a mesma. Aumentei meu som e ouvi o Vinícius recitando uma poesia, dizendo ao final, essa é a minha mais nova namorada.

                                                    


esse texto é Para Priscila Amaral....
leandro rosa felix, , professor, baixista da banda livre docente de Franca e amigo de longa data, é o cara que iniciou o fanzine âncora comigo e que também pode reivindicar a paternidade desse blog. 

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